Francisco, 102 anos, foi internado no dia seguinte à esposa, de 101 anos. 'Eles se amam demais, é lindo de ver', diz família.
Por Marília Marques, G1 DF
"Cadê Bastiana, ela tá bem?" É desse modo que, diariamente, Francisco de Alencar, 102 anos, acorda e pergunta pela saúde da esposa, Sebastiana Matos, de 101. Casados há 82 anos, os aposentados estão internados, há dois dias, no mesmo quarto do Hospital Regional de Samambaia.
A história de amor deles e o cuidado de um com o outro chamou a atenção dos profissionais de saúde que fazem o atendimento no hospital público do Distrito Federal.
Ela, com o agravamento no quadro de diabetes, foi internada na segunda-feira (16), com a glicemia alta e sintomas que indicavam o aumento da pressão arterial. Inicialmente gripado, Francisco deu entrada no dia seguinte e foi diagnosticado com insuficiência renal. Em alas diferentes, os dois não cansavam de perguntar um pelo outro, conta a neta do casal, Jane Alves.
"Meu avô queria saber se a 'Bastiana' dele estava bem, se ainda estava ali."
Percebendo a situação, a direção do hospital quebrou o protocolo e decidiu colocar os dois no mesmo quarto. Desde quinta-feira (19), Sebastiana e Francisco passam boa parte do tempo de mãos dadas, com as camas lado a lado.
'Sebastiana já comeu?'
Mais debilitada por causa dos sintomas da doença de Alzheimer e, às vezes, inconsciente, Sebastiana expressa poucas reações. No entanto, mesmo com dificuldade em se movimentar, o marido não deixa de se preocupar.
"Ele se preocupa mais com ela do que com ele mesmo. Na hora que a comida dele chega, meu avô quer saber se a dela chegou também."
"Ontem [quinta] perguntamos a ele se, quando casaram, se amavam muito. Meu avô respondeu que ainda ama, que é muito apaixonado por ela", conta a neta sorrindo. "É muito lindo de ver o amor dos dois".
Na saúde e na doença
Ainda sem previsão de alta médica, mas com o quadro do casal considerado "mais estável", durante o dia a família decidiu juntar as camas onde os idosos estão deitados. À noite, por causa dos aparelhos, elas precisam ser separadas. "Quando se afastam ela sente muito", diz a neta.
"Meu avô passa a noite toda procurando pela mão dela."
Ao G1, a família de Francisco e Sebastiana contou que a morte de um antes do outro é uma preocupação. No hospital, os dois combinaram que "um não vai morrer sem o outro", conta Jane.
"Ele ora que quando Deus levar ele, que Deus leve a 'Bastiana' também."
O amor, de tantos anos, foi cultivado com declarações diárias. Jane lembra que os dois costumam dizer que são muito felizes. O avô, em especial, repete que a mulher "é tudo para ele".
"Sempre dizem que, se pudessem, viveriam tudo de novo."
Aventura de amor
Foi na década de 1930 que a história de amor entre Francisco e Sebastiana começou. À procura de trabalho, ainda jovem, Francisco trocou a vida no Maranhão pela atividade no campo, em Goiás.
O primeiro emprego foi em uma fazenda, onde el encontrou a mulher que, futuramente, se tornou sua esposa. Filha dos donos da casa, mas sem apoio do pai para assumir o relacionamento, a jovem Sebastiana aceitou fugir dali com o então "namorado de olhos azuis".
"Ele já a achava muito bonita, mas não tinha coragem de falar porque não se sentia digno dela", conta a neta.
"A tia dela foi o cupido, mas meu bisavô não queria saber porque ele [Francisco] não tinha posses".
Fazendo jus às grandes histórias de amor narradas em filmes, o casal marcou um dia de encontro para fugir a cavalo, em outubro de 1936.
"No caminho, pararam em uma igreja e se casaram."
Com o compromisso formalizado, Sebastiana e Francisco só voltaram à cidade natal dela quando o 12º filho nasceu, em 1961.
Centenários, eles recentemente celebraram os respectivos aniversários, com direito à festa, bolo e velinhas – de três dígitos. A comemoração, valorizada pela família, reuniu cerca de 70 netos e 45 bisnetos e oito tataranetos.
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