Ministro da Transparência criticou Lava Jato em conversa com Renan. Ele é o segundo ministro a deixar cargo por gravações de Sérgio Machado.
30/05/2016 19h40 - Atualizado em 30/05/2016 20h07
Do G1, em Brasília
O ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Fabiano Silveira, deixou nesta segunda-feira (30) o comando da pasta, informou no início da noite a assessoria da Presidência da República.
Ele enviou carta de demissão ao presidente Michel Temer na qual afirma que, "não obstante o fato de que nada atinja a minha conduta, avalio que a melhor decisão é deixar o Ministério" (leia a íntegra da carta ao final desta reportagem).
A decisão do ministro foi tomada após ter sido divulgado neste domingo (29) teor de sua conversa com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), na qual ele criticou a condução da Operação Lava Jato pela Procuradoria Geral da República (PGR).
Reportagem exclusiva do Fantástico revelou neste domingo gravações na qual Fabiano Silveira, além criticar a Operação Lava Jato, dá orientações a Renan Calheiros e ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado – ambos investigados no esquema de corrupção que atuava na Petrobras (assista ao vídeo acima). A conversa foi gravada por Machado, novo delator da Lava Jato, em 24 de fevereiro.
A revelação motivou protestos. Chefes regionais do ministério começaram a entregar os cargos nos estados, em protesto. Servidores do ministério, sindicato e organizações como a Transparência Internacional pressionaram pela saída do ministro.
Na carta de demissão, Fabiano Silveira afirma que não fez "nenhuma oposição" ao trabalho do Ministério Público.
"Foram comentários genéricos e simples opinião, decerto amplificados pelo clima de exasperação política que todos testemunhamos. Não sabia da presença de Sérgio Machado. Não fui chamado para uma reunião. O contexto era de informalidade baseado nas declarações de quem se dizia a todo instante inocente", diz Silveira no texto da carta.
Silveira se encontrou com o presidente em exercício Michel Temer na noite deste domingo. Na reunião, Temer havia avaliado que o caso de Fabiano Silveira era “menos grave” que o do senador Romero Jucá (PMDB-RR), flagrado em gravações de Sérgio Machado sugerindo um "pacto" para barrar a Operação Lava Jato. Em razão da repercussão negativa dos áudios, Jucá teve de deixar o comando do Ministério do Planejamento.
O conteúdo da gravação de Silveira gerou intensa repercussão política em Brasília nesta segunda-feira. Enquanto parlamentares da base aliada de Temer cobraram explicações públicas do ministro, a oposição exigiu a saída de Fabiano Silveira do governo. À tarde, o presidente em exercício decidiu não demitir o ministro, à espera da repercussão política do caso.
Servidores
Na manhã desta segunda, o Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon Sindical) – entidade que representa os servidores da extinta Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tesoureiro Nacional – cobrou, por meio de nota, a "exoneração imediata" do ministro da Transparência.
Além disso, servidores da pasta organizaram uma manifestação nesta segunda para pedir a saída de Silveira do comando do Ministério da Transparência. No ato, os funcionários da extinta CGU lavaram as escadas do prédio que abriga o órgão de combate à corrupção no governo federal.
Gravações
Cerca de três meses antes de assumir o Ministério da Transparência, Fabiano Silveira esteve em uma reunião na residência oficial de Renan Calheiros na qual a Operação Lava Jato foi amplamente discutida.
Participam da reunião, além de Sérgio Machado e Renan Calheiros, Bruno Mendes, advogado e ex-assessor do presidente do Senado, e Fabiano Silveira, que, à época, integrava o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
No encontro, relatou o ex-presidente da Transpetro aos investigadores, foram discutidas as providências e ações que ele estava pensando em relação à Operação Lava Jato.
No áudio, é possível entender que Fabiano Silveira orienta Renan e Sérgio Machado sobre como se comportar em relação à PGR. A qualidade do áudio é ruim, há varias pessoas na sala, mas é possível identificar as vozes do presidente do Senado, do ex-presidente da Transpetro, de Fabiano Silveira e de Bruno Mendes.
Recuos
Desde que assumiu o comando interino do Palácio do Planalto, em 12 de abril, Michel Temer já enfrentou crises envolvendo a Lava Jato, polêmicas com artistas por conta da extinção do Ministério da Cultura e duras críticas em razão de ter montado um ministério só com homens. Em várias situações, ele recuou após sofrer pressões da opinião pública.
Na semana passada, em resposta às críticas que vinha sendo alvo por conta dos recuos políticos em apenas duas semanas de governo, Temer afirmou, ao apresentar medidas para a economia, que vai voltar atrás sempre que perceber que cometeu erros na condução do governo. Na ocasião, o presidente em exercício não citou nenhum caso específico, mas disse que “não tem essa de que não erro”.
“As pessoas se acostumaram a quem está no governo dizer que não pode voltar atrás. Não temos compromisso com o equívoco. Quando houver um equívoco governamental, reveremos este fato de modo que vi aqui alguns dizerem ‘o Temer está frágil, não sabe governar’. Conversa!”, disse Temer, logo após dar um tapa na mesa.
“Fui secretário de Segurança Pública em São Paulo e tratava com bandidos. Sei como fazer o governo e saberei como conduzi-lo. Quando perceber que houve um equívoco na fala, na condução do governo, reverei posição. Não tem essa coisa de ‘não erro’. Se o fizer, consertá-lo-ei”, completou o peemedebista.
Recebi do Presidente Michel Temer o honroso convite para chefiar o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.
Carta de demissão
Leia abaixo a íntegra da carta de demissão do ministro Fabiano Silveira
Recebi do Presidente Michel Temer o honroso convite para chefiar o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.
Nesse período, estive imbuído dos melhores propósitos e motivado a realizar um bom trabalho à frente da pasta.
Pela minha trajetória de integridade no serviço público, não imaginava ser alvo de especulações tão insólitas.
Não há em minhas palavras nenhuma oposição aos trabalhos do Ministério Público ou do Judiciário, instituições pelas quais tenho grande respeito.
Foram comentários genéricos e simples opinião, decerto amplificados pelo clima de exasperação política que todos testemunhamos. Não sabia da presença de Sérgio Machado. Não fui chamado para uma reunião. O contexto era de informalidade baseado nas declarações de quem se dizia a todo instante inocente.
Reitero que jamais intercedi junto a órgãos públicos em favor de terceiros. Observo ser um despropósito sugerir que o Ministério Público possa sofrer algum tipo de influência externa, tantas foram as demonstrações de independência no cumprimento de seus deveres ao longo de todos esses anos.
A situação em que me vi involuntariamente envolvido – pois nada sei da vida de Sérgio Machado, nem com ele tenho ou tive qualquer relação – poderia trazer reflexos para o cargo que passei a exercer, de perfil notadamente técnico.
Não obstante o fato de que nada atinja a minha conduta, avalio que a melhor decisão é deixar o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.
Externo ao Senhor Presidente da República o meu profundo agradecimento pela confiança reiterada.
Brasília, 30 de maio de 2016.
Fabiano Silveira