Sobrenomes Yared, Deppman e Roig ficaram conhecidos após serem alvos de tragédias e hoje eles buscam justiça nas urnas
As
famílias Yared, Deppman e Roig vivem em três Estados diferentes, não se
conhecem pessoalmente, mas têm em comum a dor da morte precoce dos
filhos, vítimas de casos trágicos amplamente divulgados pela imprensa. E
a busca por justiça foi parar nas urnas neste ano com ajuda de amigos e
voluntários. Candidatos ao cargo de deputado, os novatos Christiane
Yared, Marisa Deppman e Marcos Roig depositam nas eleições 2014 o fim do
sentimento de impunidade, presente num violento acidente de trânsito,
na frieza de um menor armado e em um erro médico, respectivamente, que
interromperam bruscamente a vida de três jovens.
Ouvidos pelo iG, os candidatos
garantem que lutar contra o tipo de crime que desestabilizou suas vidas é
o que alimenta o engajamento e desperta uma versão ativista da
experiência do luto.
Logo após os casos, todos se envolveram em
manifestações, associações e atendimentos às vítimas ligados ao próprio
drama, buscando canalizar o sentimento de vingança, revolta e descrença
no poder público.
Fazer
compras em um supermercado de Curitiba (PR), por exemplo, não é uma
tarefa fácil para a empresária Christiane, mãe de Gilmar Yared, um dos
jovens mortos no acidente envolvendo o ex-deputado Carli Filho, em 2009, que dirigia entre 161 km/h a 173 km/h.“Dificilmente saio sem ser reconhecida por alguma mãe que perdeu o filho [aos 26 anos] ou por alguém que apenas quer me dar um abraço. [Minha luta] é um caminhar que já dura cinco anos, infelizmente, acompanhada pela morte do meu filho”, desabafa.
E continua: “Até hoje o assassino não recebeu nem a multa por excesso de velocidade”. Em maio deste ano, a Justiça do Paraná decidiu pela terceira vez que o acusado enfrentará júri popular pelas mortes, mas sem data marcada.
Casos de violência:
Victor Deppman: Universitário é morto durante tentativa de assalto na zona leste de SPGilmar Yared: Justiça nega recurso e ex-deputado Carli Filho vai a júri popularRodrigo Roig: Guerreiro contra a dengue no Rio de Janeiro
Um mês após a morte de Gilmar, ela já atendia famílias enlutadas e formou um grupo de discussões sobre a violência no trânsito. Meses depois, o ativismo foi formalizado com a fundação do Instituto Paz no Trânsito (IPTRAN), que apresenta projeto de conscientização e responsabilidade aos motoristas infratores.
“A política surgiu de uma forma natural. Estamos conseguindo mudar a realidade de Curitiba e isso pode ser feito no Brasil. [Os projetos] são frutos do meu filho plantado, não morto.
Prometi em seu velório que o plantaria, não o enterraria. E tenho vontade política para isso”, encerra a candidata à deputada federal pelo PTN/PR, que já havia ministrado quatro palestras no dia da entrevista.
“Crime não tem idade, punição sim”
A advogada Marisa Deppman dedicou sua carreira à causa trabalhista.
A morte do filho Victor Hugo Deppman, então com 19 anos, executado por um menor de 17 após entregar o celular,
na zona leste de São Paulo, no entanto, mudaria isso.
Desde abril de
2013, ela voltou a abrir os livros de direito penal e buscou dominar os
conceitos da área criminalista. “Eu e meu marido precisávamos de uma
motivação para viver, tentar não enlouquecer ou entrar numa depressão.
Prometi ao meu filho que ele não seria apenas uma estatística policial.”
Veja imagens dos candidatos com os filhos que foram vítimas de tragédias:
Marisa Deppman com o filho Victor Hugo, morto no ano passado durante assalto na zona leste de São Paulo.
Ela
então elaborou dois projetos de lei defendendo mudanças expressivas no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a redução da maioridade
penal, mas ambos foram engavetados em Brasília. Neles, Marisa defendia
que o menor praticante de crime hediondo sairia da proteção do ECA e
passaria a responder pela legislação comum, o Código Penal.
O assaltante
que matou seu filho, por exemplo, pegaria até 30 anos por latrocínio e
agravantes. “Ele cumpriria até os 21 na Fundação Casa e depois seria
transferido ao presídio comum”.
Sem resposta das autoridades políticas,
ela decidiu que tentaria chegar ao Congresso Nacional pelo PSDB/SP com o
mote Crime não tem idade, punição sim.
“Só
quem passa por isso entende. Eu tenho outro filho, sobrinhos e quero ter
netos, mas com segurança e viver em paz.
Sou candidata porque quero
tentar fazer alguma coisa”, disse ao iG, ressaltando ainda que não consegue dormir quando Vinicius Deppman, de 24 anos, sai para baladas ou decide dormir fora.
Para ela, os menores perderam o medo de cometer crimes porque se apoiam
na impunidade.
E rejeita o título da extremista e garante que não está
sozinha.
“O brasileiro chegou ao limite na questão de impunidade,
violência e falta de segurança. E não existe Direitos Humanos.
Hoje só
vemos ações dos 'Direitos dos Manos', que favorecem os criminosos e não
famílias de bem.”
“Lutar para reconstruir”
Foram
cinco dias frequentando clínicas particulares até o tardio diagnóstico
de dengue hemorrágica. Horas depois, Rodrigo Yamawaki Roig, aos 6 anos,
teve hemorragia interna e não resistiu.
A morte do filho alterou o rumo
da família Roig desde fevereiro de 2008.
“Eu fiquei extremamente mal.
Foi quando recebi a dica:
‘Use essa energia para resolver o problema.
Lutar para reconstruir’.
Eu já tinha perdido um pedaço de mim. A saída
era canalizar a revolta para o bem”, explica o engenheiro Marcos Roig,
que é pai de Luísa e Yasmin, de 11 e 16 anos, e candidato à Assembleia
Legislativa do Rio de Janeiro.
Pouco mais de um ano depois, em julho de 2009, a
parceira com outras vítimas da doença resultaria na criação da
Associação de Vítimas da Dengue (Avide).
Ao alcançar divulgação nacional
com o caso de negligência médica, o nome de Rodrigo foi escolhido para
batizar uma clínica da família, no Complexo do Alemão, no Rio.
Atuando
como gestor do novo espaço, Roig conseguiu se especializar no tema e
concluir que os funcionários da saúde pública e privada não estão
preparados para ajudar a população em casos de epidemia.
“Vivemos
não só um problema de infraestrutura, mas de profissionais também,
dentro da rede pública e privada.
Não dá para endemonizar apenas o
serviço público”, resume. Roig ressalta ainda que muitos deveriam
ingressar na vida pública – como político ou formador de opinião – antes
de viver uma tragédia.
O engenheiro se orgulha da comitiva voluntária
que conseguiu formar e que ainda dispensará ajuda financeira do partido.
"Posso não ganhar essas eleições, mas já começo a construir uma
história na política", concluiu.
O desempenho de Keiko Ota
Não
é o primeiro ano em que vítimas de casos emblemáticos tentam chegar ao
poder público. Masataka Ota e Keiko Ota também conquistaram cargos
públicos após exposição no jornalismo policial. Eles ficaram conhecidos
após a morte violenta do filho de Ives, de 8, vítima de um sequestro em
1997. Os três acusados pelo crime foram condenados menos de um ano após o
assassinato da criança.
Candidata à reeleição, a
parlamentar Keiko (PSB/SP) não deixou uma boa impressão na sua primeira
passagem pelo Congresso, no entanto. É o que explica Antônio Augusto de
Queiroz, analista político e diretor de documentação do Departamento
Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), entidade que acompanha o
trabalho do Congresso desde 1983.
Segundo ele, a deputada
não participou de discussões relevantes e não conseguiu transformar em
lei nenhuma das propostas de sua autoria, quase todas relacionadas ao
setor que representa - alteração do Código Penal em casos de crimes
hediondos e a criação do Fundo de Assistência às Famílias de Vítimas de
Crimes Dolosos (FAVIC)."Candidatos que se promovem em função de tragédias, normalmente, são uma decepção no desempenho do mandato. Acham que podem converter uma revolta em políticas públicas para combater um determinado tipo de atitude", avalia o especialista. Para ele, ausência de experiência, traquejo e capacidade de liderança, por exemplo, podem sentenciar um mandato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário