Consumidora em farmácia; União é obrigada a usar verba de publicidade para pagar remédio caro
Por decisão judicial, a União está sendo obrigada a usar verbas da publicidade oficial, e não do SUS, para fornecer remédio importado e de alto custo a uma jovem de 22 anos com doença rara.
A decisão inicial veio de uma liminar concedida pelo juiz federal Paulo Marcos Rodrigues, de Guarulhos, em 2015. A Advocacia Geral da União recorreu da decisão.
O desembargador Johonsom di Salvo, do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região, em São Paulo, negou provimento ao recurso da União e manteve a decisão de Rodrigues. O acordão deve ser publicado nesta terça (4).
Judicialização da saúde
Decisão do Supremo sobre o fornecimento de remédios guiará as ações pelo país
1 em 4 remédios ofertados por decisão da Justiça já está no Sistema Único de Saúde
Com tratamentos de até R$ 2,5 milhões, doentes dependem de decisão do Supremo
Entenda a judicialização da saúde e o debate do Supremo sobre acesso a remédios
A decisão abre um novo capítulo no debate da judicialização, que está sob julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal). Ela reconhece que os recursos do SUS (Sistema Único de Saúde) são finitos, proíbe que sejam usados para a compra de drogas caras e sem aprovação, mas dá a alternativa de buscar recursos de outras áreas.
"O SUS não pode pagar tratamentos específicos e caríssimos, o cobertor é curto. Você tem que decidir se uma pessoa sobrevive custando R$ 1 milhão ou se 1 milhão de pessoas sobrevivem custando R$ 1", disse o juiz Rodrigues, 37, em entrevista à Folha.
No caso julgado, a jovem tem uma doença genética (hemoglobinúria paroxística noturna, HPN) que destrói os glóbulos vermelhos. Provoca anemias, tromboses, dores torácicas e abdominais, hipertensão pulmonar, problemas renais, entre outros.
Sem melhora com os tratamentos tradicionais, ela ingressou com a ação solicitando a droga Soliris (Eculizumabe), importada e sem registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que promete aumentar sua expectativa de vida. Por ano, o tratamento custa cerca de R$ 1 milhão.
"A União não é só SUS. Talvez caiba olhar todo o orçamento federal para ver se não há áreas menos prioritárias que estão recebendo recursos vultuosos que podem ser canalizados para a saúde", afirma Rodrigues.
Ao conceder a liminar, em setembro de 2015, o juiz diz que havia R$ 45 milhões alocados para a propaganda oficial da União, segundo o Portal da Transparência.
Para ele, a publicidade, mesmo a de utilidade pública (sobre Aids e dengue, por exemplo), é importante, mas não mais do que situações em que a pessoa pode morrer caso não receba a medicação.
"Ao manter a propaganda estatal, muitas vezes de caráter de promoção do governante, ou a compra de talheres de prata para o Itamaraty, enquanto há pessoas morrendo por falta de tratamento, o Executivo comete uma inconstitucionalidade."
Ele explica que cabe aos juízes reconhecer a compatibilidade de atos administrativos e de leis com a Constituição. "Não estamos dizendo que não pode usar verba da publicidade, mas sim que, enquanto houver necessidade urgentíssima de saúde pública, a prioridade é essa."
Antes de se tornar juiz federal, Rodrigues já foi procurador do município de São Paulo por cinco anos.
Para se defender, a União usou dois argumentos: que o o Judiciário não pode interferir na alocação orçamentária do Executivo e que a autora da ação não pediu que fosse usada verba da publicidade.
"Ela pediu o medicamento. Mas o Código de Processo Civil autoriza o juiz a usar todos os meios para conseguir a realização do direito da parte, que é o de sobreviver."
Em sua decisão, o desembargador di Salvo também refutou a alegação da União. Para ele, o Judiciário está apenas determinando o cumprimento das regras constitucionais. "(...) Está fazendo recordar a verdade sublime que o Estado existe para o cidadão, e não o contrário".
Após a publicação da sentença, a União pode recorrer novamente e, em última instância, o caso pode chegar para análise do STF.
Edição impressa
Comentários
Ver todos os comentários (3)
Termos e condições
Caro leitor,
para comentar, é preciso ser assinante da Folha. Caso já seja um, por favor entre em sua conta cadastrada. Se já é assinante mas não possui senha de acesso, cadastre-se.
Faça seu login
Cadastre-se
Assine
germano ottmann (04/10/2016 08h17) há 4 dias
Avaliar como positivo 1
Avaliar como negativo 0
Denunciar
Perfeito ..parabéns . A colocação sobre prioridades de gastos do governo é ótima...o exemplo da propaganda e dos talheres de prata mostra isso...vamos diminuir o caviar e o uísque por conta da viúva em pró da saúde...isso sim.
Responder
Rodrigo ROAL (04/10/2016 08h22) há 4 dias
Avaliar como positivo 1
Avaliar como negativo 0
Denunciar
Tem que pagar mesmo, doa a quem doer, custe o que custar. Sem essa de o executivo fazer conchavo com o STF para que seja parido qualquer novo acordão, mais um deles, que vise a negar ao cidadão o direito humano fundamental ah saúde, sob qualquer pretexto.
Responder
Alencar Gracino (04/10/2016 10h57) há 4 dias
Avaliar como positivo 0
Avaliar como negativo 0
Denunciar
Que tal pegar dinheiro também do auxílio moradia dos magistrados? Acho que não fará falta para alguns e ajudaria muitos.
O comentário não representa a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem
Responder
recomendado
Medidas de Lewandowski no CNJ serão reavaliadas
Família da namorada de Suplicy fez ao menos seis doações…
Patrocinado
7 Dicas para o futuro profissional millenial
(Ibmec)
Patrocinado
Conheça todos os atributos da nova linha de picapes da…
(Mitsubishi)
Fale com a Redação - leitor@
Nenhum comentário:
Postar um comentário