Setor de turismo não é afetado por sanções impostas ao país pela ONU. Planos incluem reconstrução da cidade de Wonsan como resort de esqui com lojas milionárias, campo de golfe e investimentos de US$ 1,5 bilhão.
Por Ju-min Park e James Pearson, Reuters
Na cidade litorânea de Wonsan, famílias norte-coreanas assam churrasco na praia, vão pescar e tomam sorvetes no verão. Para seu líder Kim Jong-un, o resort é um refúgio de verão, um futuro templo turístico e um bom lugar para testar mísseis.
Ele está reconstruindo a cidade de 360 mil habitantes e quer transformá-la em um polo turístico bilionário. Ao mesmo tempo, lançou quase 40 mísseis da região, como parte de seus testes acelerados da dissuasão nuclear da Coreia do Norte.
“Pode parecer maluco para quem é de fora disparar mísseis de um lugar que ele quer desenvolver economicamente, mas é assim que Kim Jong-un administra seu país”, diz Lim Eul-chul, especialista em economia norte-coreana na Kyungnam University, na Coreia do Sul.
A combinação de turismo e armas nucleares é emblemática para a estratégia de sobrevivência de Kim Jong-un, dizem pesquisadores e pessoas familiarizadas com o projeto.
Os planos da Coreia do Norte para Wonsan cresceram desde que foram anunciados pela primeira vez em 2014. Examinados aqui em detalhes pela primeira vez, eles são descritos em 160 páginas em quase 30 cadernos produzidos pela Corporação de Desenvolvimento da Zona de Wonsan em coreano, chinês, russo e inglês em 2015 e 2016.
Turismo é uma das cada vez menores fontes de dinheiro norte-coreanas não atingidas pelas sanções das Nações Unidas, e os cadernos anunciam para investidores estrangeiros cerca de US$ 1,5 bilhão em potenciais empreendimentos na Zona Turística Especial de Wonsan, uma área cobrindo mais de 400 km quadrados. Kim já construiu um novo resort de esqui e um novo aeroporto lá.
Segundo um dos cadernos, a zona inclui aproximadamente 140 relíquias históricas, dez praias de areia, 680 atrações turísticas, quatro fontes de águas minerais, diversos resorts de banhos e lagos naturais e “mais de 3,3 toneladas de lamas com propriedades terapêuticas contra neuralgia e colite”.
O projeto ao qual Kim está convidando investidores a ajudar a construir inclui uma loja de departamentos de US$ 7,3 milhões, obras de desenvolvimento no centro da cidade no valor de US$ 197 milhões e um campo de golfe de US$ 123 milhões (incluindo uma taxa de US$ 62,5 milhões para alugar a terra).
No início deste ano Kim enviou 16 representantes à Espanha para coletar ideias para Wonsan. Eles visitaram Marina d’Or, um dos maiores complexos de férias do país mediterrâneo, e o parque Terra Mitica em Benidorm. Terra Mitica atende aos fãs "de sensações extremas", de acordo com seu site.
“Eles viram esses lugares com seus próprios olhos e filmaram alguns deles”, disse um porta-voz na embaixada norte-coreana em Madri. Ambos os parques confirmaram as visitas; uma porta-voz do Terra Mitica disse que os norte-coreanos ficaram impressionados por seus temas, incluindo as antigas civilizações do Egito, Grécia e Roma.
Nenhum grande parceiro estrangeiro disse que irá apoiar os projetos de Kim para Wonsan. O novo aeroporto, concluído em 2015, ainda não abriu para voos internacionais. Os EUA recentemente proibiram seus cidadãos de visitarem a Coreia do Norte. Sanções internacionais agora banem todos os empreendimentos conjuntos com o país.
Ainda assim, o plano é estrategicamente vital para Kim, dizem ex-diplomatas norte-coreanos. Quando ele assumiu o poder, em 2011, ele herdou uma sociedade oficialmente administrada pelos militares, mas aquelas pessoas sobreviviam amplamente por transações no mercado negro. No papel, a Coreia do Norte é uma economia estatal; mas na verdade, sete a cada 10 norte-coreanos dependem do comércio privado para viver, segundo Thae Yong Ho, que foi vice-embaixador da Coreia do Norte em Londres e desertou com sua família em 2016.
Kim é visto pelas pessoas de fora como todo poderoso, mas os comerciantes livres da Coreia do Norte o tornam mais vulnerável do que parece, disse Thae à Reuters. O líder está procurando uma maneira de aproveitar forças militares e de mercado para sobreviver.
Armas nucleares são uma parte de sua resposta – porque Kim espera que elas custarão menos para serem mantidas do que as tradicionais armas pesadas norte-coreanas.
Projetos como Wonsan são a outra parte. Ele quer cortar parte dos fundos que dá aos militares e alocar mais dinheiro na economia civil.
“Kim Jong-un sabe que ele só pode controlar a sociedade e garantir sua longa liderança se seu papel e influência na economia forem ampliados”, diz Thae.
Amigáveis
A Coreia do Norte quer atrair mais de 1 milhão de turistas por ano em curto prazo e cerca de 5 a 10 milhões “em um futuro previsível”, dizem os cadernos sobre Wonsan. A Corporação de Desenvolvimento da Zona de Wonsan, o órgão estatal que supervisiona o projeto, não respondeu aos pedidos de comentários.
Não há estatísticas atualizadas sobre o número de visitantes da Coreia do Norte. A China diz que mais de 237 mil chineses estiveram no país em 2012, mas parou de publicar seus dados em 2013. Em comparação, 8 milhões de chineses visitaram a Coreia do Sul em 2016.
O Korea Maritime Institute, uma organização no sul, estima que o turismo gera cerca de US$ 44 milhões em lucros anuais para a Coreia do Norte – cerca de 0,8% do PIB do país. Aproximadamente 80% de todos os turistas estrangeiros na Coreia do Norte são chineses. Ocidentais e russos correspondem ao resto.
Os cadernos sobre Wonsan são acolhedores. “Funcionários e moradores dessa zona têm uma boa compreensão sobre o turismo e são amigáveis em relação aos turistas”, diz um deles.
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