PGR diz que na reunião tucano pediu R$ 10 milhões para esvaziar apuração. Em nota, PSDB disse apoiar investigações da Lava Jato desde o início.
22/06/2016 23h43 - Atualizado em 23/06/2016 02h26
Do G1, em Brasília
Uma reunião realizada em 21 de outubro de 2009, no Rio de Janeiro, negociou o apoio do então presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), para esvaziar as investigações da CPI criada naquele ano no Senado para investigar suspeitas de superfaturamento nas obras da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco. O encontro ocorreu dois meses antes do encerramento dos trabalhos da comissão.
Vídeo que faz parte das investigações da Operação Lava Jato, obtido com exclusividade pela TV Globo e pelo G1, mostra detalhes do encontro do dirigente tucano com o então diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), empreiteiros e o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano (assista a trechos do vídeo abaixo).
As imagens mostram que também compareceram ao encontro o então presidente da Queiroz Galvão, Idelfonso Colares Filho, e Erton Medeiros, representante da Galvão Engenharia na negociação. Todos os participantes da reunião, à exceção de Sérgio Guerra, são investigados pela Lava Jato.
Personagem central da reunião, Sérgio Guerra morreu em 2014, aos 66 anos. Ele tinha câncer de pulmão, e uma pneumonia agravou seu estado de saúde. À época em que foi realizada a filmagem, o tucano, além de presidir o PSDB, ocupava uma cadeira no Senado. No ano em que morreu, entretanto, ele era deputado federal.
"Vamos fazer uma discussão genérica, não vamos polarizar as coisas. [...] Eu disse ao Aluísio lá, segura. [...] Quando essa [...] começou, eu disse: 'não vai ter isso [...], não vai. [...] Você não segura'", diz Sérgio Guerra em um dos trechos da reunião, que a Procuradoria Geral da República interpreta como promessa de apoio para evitar o aprofundamento das investigações da CPI (leia aqui a íntegra da conversa).
"Queria fazer o combate sem ir atrás de pessoas", fala o tucano em outro momento da conversa.
O encontro de 2009 que aponta o suposto envolvimento do ex-dirigente do PSDB com o esquema de corrupção que atuava na Petrobras ocorreu em uma sala comercial localizada no edifício Leblon Empresarial, na zona sul do Rio.
As imagens que mostram detalhes da reunião, gravadas pelo circuito interno de segurança da sala, foram entregues ao Ministério Público pelo empresário Marcos Duarte, proprietário do imóvel onde ocorreu o encontro e amigo de Fernando Baiano.
Segundo a Procuradoria Geral da República, o encontro serviu para acertar o pagamento de R$ 10 milhões em propina ao tucano para que ele freasse as investigações da CPI da Petrobras no Senado.
O Tribunal de Contas da União havia apontado superfaturamento de R$ 58 milhões em um contrato da estatal com o consórcio Refinaria Abreu e Lima, formado pelas construtoras Norberto Odebrecht, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Galvão Engenharia, e responsável por parte das obras do complexo petrolífero.
O relatório final da comissão, entretanto, apontou que não havia irregularidades no contrato. A Queiroz Galvão e a Galvão Engenharia sequer foram citadas no parecer final da CPI, destacou Janot na denúncia, que terminou sem indiciar ninguém.
Delator do esquema de corrupção, Paulo Roberto Costa relatou que o suborno foi pago a Sérgio Guerra pela construtora Queiroz Galvão, que integrava o consórcio investigado pela CPI.
Nesta quarta-feira (22), Eduardo da Fonte, que também é conhecido como Dudu da Fonte, foi denunciado pela Procuradoria Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo a PGR, o parlamentar participou ativamente da negociação da propina e, por isso, deve ser condenado por corrupção passiva, perder o cargo e pagar R$ 10 milhões em danos morais.
Dos seis participantes da reunião, três já sofreram condenações no âmbito da Lava Jato:
- Erton Medeiros (Galvão Engenharia): condenado a 12 anos e 5 meses de prisão por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa.
- Fernando Soares (lobista): condenado a 16 anos e 1 mês por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
- Paulo Roberto Costa (ex-diretor da Petrobras): condenado em 8 processos por corrupção, lavagem de dinheiro, e pertencimento a organização criminosa.
Veja abaixo trechos do vídeo que mostra a negociação para frear as investigações da CPI da Petrobras de 2009 e leia o que disseram os participantes da reunião.
'Nós não somos da polícia'
Segundo a PGR, Sérgio Guerra e Eduardo da Fonte pediram propina de R$ 10 milhões a empreiteiros para, em troca, impedir que a CPI da Petrobras aprofundasse as investigações sobre construtoras.
Eduardo da Fonte e o empreiteiro Ildefonso Colares chegaram a negar, em interrogatórios, os encontros para tratar da propina que, segundo delatores, foi tratada na reunião que a TV Globo e o G1 tiveram acesso.
No trecho acima, o ex-presidente do PSDB diz que queria fazer o combate "sem ir atrás de pessoas". A frass é dita após Paulo Roberto Costa apontar o "atrito com o TCU", que havia apontado as irregularidades nas obras da Refinaria Abreu e Lima que embasaram a criação da CPI, como uma questão a ser resolvida.
Paulo Roberto Costa: no TCU que a confusão da oito [...] Isso pode, isso pode ser colocado como uma construção paliativa. Isso pra nós é um dos motivos de maior atrito com o TCU. Então se resolver isso, acho que há um caminho gigantesco que a gente vai ter [...] daqui pra frente. E outro assunto também importante que o Valter também [...] na realidade a gente tem métodos e critérios diferentes do TCU. Manter os sobrepreços.
Sérgio Guerra: Essa chamada CPI tem origem em vários movimentos, em várias origens, e lá atrás eu conversei com algumas pessoas de vocês, né, e dei um rumo a essa história, né. Pro meu lado, né, como era pra ter todo o combate sem ir atrás das pessoas.
Paulo Roberto Costa: Isso. isso.
Sérgio Guerra: Primeiro, porque nós não somos da polícia. Segundo, porque eu não gosto disso. Terceiro, porque acho que não construía em nada. Então, a gente ia fazer uma discussão conceitual, objetiva. Muita gente que estava colaborando com a gente, começou a colaborar e contou várias histórias, eu conversei sobre isso. Várias histórias que, normalmente, ficaram, não sei o quê, daí pra frente. Então, nós estamos num impasse lá. A intenção continua a mesma. Esse negócio de construir uma lei pra presidir essa questão das concorrências [...] não pode ficar nesse constrangimento atual.
Eduardo da Fonte: Nem uma coisa, nem outra.
Sérgio Guerra: Segundo, o Severino sou eu só. Tem também o Álvaro, que por lado da
Triunfo [...] não sei o quê.
Paulo Roberto Costa: Ai como o pessoal trabalha lá? Ai vai lá na obra lá, refeitório com ar-condicionado, com nutricionista tal, custa mais caro? Custa. A gente pode abrir mão disso com o país? Eu acho que não, não pode abrir mão. Então, pô. Mas tudo dá...
Sérgio Guerra: Vamos fazer uma discussão genérica, não vamos polarizar as coisas. [...] Eu disse ao Aluísio lá atrás: 'Segura". [...] Quando essa coisa começou, eu disse: 'não vai ter isso', 'vai, você não segura. 'Álvaro'
'Tenho horror a CPI'
Em outro momento da reunião, Sérgio Guerra chega a dizer que 'tem horror a CPI", e afirma não ter assinado nem mesmo "a da Dinda", numa suposta referência às investigações contra o ex-presidente e hoje senador Fernando Collor (PTC-AL).
Na visão da Procuradoria Geral da República, Guerra buscava passar a impressão de não concordar com as investigações da CPI da Petrobras como uma forma de convencer os outros integrantes da reunião da necessidade de que eles pagassem a propina para esfriar os trabalhos da comissão.
Sérgio Guerra: eu tenho horror a CPI. Nem a da Dinda eu assinei. É uma coisa deplorável. Fazer papel de polícia, parlamentar fazendo papel de polícia.
Fernando Baiano: Se conseguir equacionar essa questão do TCU, é fundamental, porque realmente isso aí. Essas 8.666 [possível referência à Lei 8.666, de 1993, que rege as contratações entre os entes governamentais e a iniciativa privada] é isso aí.
'Suporte ao senador'
A PGR destaca que os integrantes da reunião utilizam "termos obtusos" para se referir à propina durante a reunião. Para identificar o momento exato em que o pagamento da vantagem indevida é tratada no encontro, os investigadores tiveram de recorrer ao lobista Fernando Baiano.
Em um dos depoimentos de sua delação preimada, Baiano afirma que o tema é tratado quando o presidente da Queiroz Galvão, Ildefonso Colares, fala em "suporte" a Sérgio Guerra e o senador responde que o assunto deveria ser tratado "entre vocês".
Ildefonso Colares Filho: Dando suporte aí ao Senador, tá tranquilo.
Sérgio Guerra: Conversa aí entre vocês.
Trecho de denúncia da )Procuradoria Geral da República contra Eduardo da Fonte (Foto: Reprodução)
Trecho de denúncia da Procuradoria Geral da República contra Eduardo da Fonte (Foto: Reprodução)
O que disseram os supeitos
Em nota enviada ao G1, Eduardo da Fonte afirmou que a denúncia da PGR "será respondida, no tempo e forma devidos, perante o Supremo Tribunal Federal". Ele ressaltou ainda que a CPI da Petrobras, de 2009, entregou ao Ministério Público 18 representações pedindo a investigação de supostas irregularidades identificadas durante os trabalhos da comissão (leia ao final da reportagem a íntegra da nota de Dudu da Fonte).
A direção nacional do PSDB afirmou, por meio de nota, que apoia as investigações da Operação Lava Jato desde o início e defende que o trabalho das instituições públicas brasileiras avance para os esclarecimentos necessários.
Também por meio de nota, a Queiroz Galvão informou que não comenta investigações em andamento.
A defesa de Paulo Roberto Costa disse que todas as informações foram prestadas ao Ministério Público Federal no acordo de colaboração premiada.
Ao G1, o advogado José Luis de Oliveira Lima, responsável pela defesa de Erton Medeiros, afirmou que seu cliente já prestou "todos os esclarecimentos devidos" e está à disposição das autoridades competentes.
O defensor de Fernando Baiano explicou que todas as informações quanto a essa reunião já foram prestadas ao Ministério Público Federal por ocasião do seu acordo de delação premiada.
Já o advogado de Ildefonso Colares Filho se limitou a dizer que não poderia comentar o assunto porque não teve acesso ao teor da denúncia apresentada nesta quarta contra Dudu da Fonte, na qual seu cliente é citado
O G1 não conseguiu contato com a assessoria da Galvão Engenharia.
Leia a íntegra da nota divulgada por Dudu da Fonte:
A denúncia do Ministério Público Federal será respondida, no tempo e forma devidos, perante o Supremo Tribunal Federal.
Anota-se, todavia, desde logo, que os membros da CPI, que hipoteticamente, se teria desejado encerrar, ofereceram, no 25/11/2009, com a CPI em andamento, 18 representações a esse mesmo Mistério Público acusador, diretamente ao seu chefe solicitando à adoção das providências necessárias à apuração das notícias de crime identificadas no decorrer dos trabalhos da Comissão, em especial as pertinentes às obras da refinaria Abreu e Lima.
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