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domingo, 18 de setembro de 2016

Neschling diz que é vítima de bandidos e que não fez 'porra nenhuma' de errado



No fim do ano passado, o Theatro Municipal de São Paulo foi sacudido por um terremoto. O diretor da fundação que o mantém, José Luiz Herencia, e o dirigente do instituto que administra as contas, o IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Cultural), William Nacked, foram acusados de desvios de R$ 15 milhões.
A instituição é hoje investigada pelo Ministério Público de SP, por uma CPI na Câmara e pela Controladoria Geral do Município. Os dois confessaram por meio de delação premiada. E voltaram suas baterias para John Neschling, até então diretor artístico do Municipal. Acusaram o maestro de conflito de interesse e de tráfico de influência ao contratar artistas de agentes que também o representam no exterior.
Neschling acabou demitido no começo do mês. Nesta entrevista, ele se defende. Diz que é vítima de "bandidos", "mentirosos". E acusa o prefeito Fernando Haddad de não ter tido caráter ao permitir que fosse afastado do Municipal: "Ele não tem nada contra mim". Abaixo, um resumo da conversa:
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O COMEÇO
Os motivos pelos quais diziam que eu era investigado foram mudando com o tempo. No início falava-se do meu salário [de R$ 150 mil por mês] e numa associação com Herencia e Nacked.
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Depois esses dois bandidos confessaram seus crimes e ficou claro que eu não participava absolutamente dessas falcatruas, desse conluio.
Por mais que tentassem me envolver, ficou claríssimo que não há nada, tanto na [investigação da] Controladoria como na Corregedoria. Então começaram com essa história de conflito de interesses.
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Isso é fruto de uma total ignorância. Você tem 15 ou 20 empresários de ópera no mundo, não mais. Eles têm listas de artistas que apresentam para as instituições [teatros e orquestras]. Eu, como artista, faço parte de algumas listas. Mas instituições só me contratam se têm interesse.
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Trabalho com esses agentes há mais de 30 anos! Não comecei a trabalhar com eles quando entrei no Municipal! Trabalho com três, quatro agentes. E, no Municipal, contratei artistas de 60 agentes. Por exemplo, o agente que está trazendo "Elektra", de Nova York: nunca trabalhei com ele na minha vida. Nenhum empresário teve mais que 12% de participação de artistas nesses três anos em que eu estive no teatro.
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POR QUE O ACUSAM
O que você quer que um mentiroso faça? Mentiroso mente. São delatores, querem se livrar das acusações. São dois ladrões, dois bandidos, corruptos, que roubaram e que são premiados por isso. Não se fala mais neles.
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Já eu sofro um massacre e não tenho nenhum desmando administrativo. Eu não fiz porra nenhuma. Eu nunca na minha vida fiz nada de errado, em 70 anos de idade, 47 anos de carreira.
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Eu trabalhei em teatros muito mais sofisticados do que o Municipal: Ópera de Viena, Massimo de Palermo, Ópera de Bordeaux. Saí da Osesp acusado de ser autoritário. Nunca de ladrão.
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Por que agora, no Municipal, eu começaria a roubar? Me deslumbrei? Depois de fazer a Osesp, de ter reconhecimento internacional, vou querer vantagens ilícitas do Theatro Municipal? Coitado do Theatro Municipal.
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AVISO
Havia uma grande desorganização, uma incompetência financeira clara e óbvia no Municipal. E isso começou a chamar a minha atenção. Não havia segurança. Não havia limpeza. Não pagavam [cachês] em dia. Os artistas vinham para SP porque tinha aqui o maestro John Neschling que os convidava. E não porque tinha o senhor Herencia, que não sabia o nome de ninguém nem fala uma palavra que não seja o português. Isso ia cair no meu colo.
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Houve atrasos de seis meses de pagamento de cachê. Criaram uma página na Itália, "Municipal fanculo". Nós fomos enxovalhados. Eu então levei a situação ao prefeito: "Fernando, isso me cheira a maracutaia. Por favor, investigue. Controle".
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Eles [Herencia e Nacked] começaram a se armar. Disseram ao prefeito que tudo se devia às extravagâncias da produção. Eu provei que não havia extrapolado um centavo do orçamento artístico. Aí entrou a controladoria. O Herencia pediu demissão.
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Nomearam o Paulo [Dallari, interventor na fundação e no IBGC]. Começaram a aparecer os maus feitos. Os dois confessaram. E começaram a fazer acusações contra mim.
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INVESTIGAÇÕES
Eu nunca fui chamado a depor pela promotoria. Meu advogado ofereceu duas vezes, não quiseram me ouvir até agora. Quiseram apreender meu passaporte. A CPI quis fazer a condução coercitiva da minha mulher, que não tem absolutamente nada a ver com essa questão.
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Os vereadores são de uma ignorância que chega a ser agressiva. Não há nada tão negativo quanto a ignorância ativa, prepotente, autoritária. Eu me lembrei dos anos de chumbo, do macartismo, uma caça às bruxas da pior qualidade. Sem nenhuma prova. Sem nenhum indício.
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Me senti péssimo. Desrespeitado. Humilhado. Disseram até que eu era um "regentinho" de esquina.
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DEMISSÃO
Até que, na quinta [1º de setembro], eu fui ao prefeito, no meio dessa guerra, já completamente cansado. Achincalhado. Eu disse: "Fernando, como amigo, o que você me propõe? O que devo fazer?".
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Ele era um político que eu respeitava... respeito ainda. O Fernando é uma pessoa especial. Mas eu achava que ele fosse mais especial. Porque sempre me deu a palavra clara de que não seria responsável pelo meu afastamento, a não ser que tivesse provas claras, cabais, da minha culpa. Como essas provas não vão aparecer, porque não existem, ele disse: "Não vou mandar você embora. Faça o que achar melhor".
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Depois dessa conversa, eu refleti. Na sexta [2], pensei em me afastar do teatro. Mas não é verdade que pedi para os assistentes saírem comigo [como foi informado ao prefeito Haddad]. Nem deixaria o teatro às moscas. Eu nunca faria isso com o prefeito.
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E ninguém é obrigado a prestar solidariedade. Aliás, como dizem, mineiro só é solidário no câncer. A verdade é que Eduardo Strausser [então assistente do maestro], em vez de decidir sair comigo, me disse: "A minha agente na Inglaterra acha que não é o momento de eu ir embora". Eu demiti ele na própria sexta! Ele deu todas as evidências de que me traía [Strausser acabou assumindo no lugar de Neschling].
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Ele é um traíra. Um bobo. Um garoto de 30 anos, um "regentinho" de merda. Dei aula de graça para ele na Suíça. Tirei ele da sarjeta, coloquei para reger. E, antes mesmo de eu sair, ele já combinava com a prefeitura para ficar.
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Um dia depois, no sábado [3], saiu uma notícia de que eu seria demitido. Vi que, se pedisse demissão, eu estaria confessando culpa. Me imolando. Decidi ficar até o final. Escrevi isso no Facebook. Mas hoje estou convencido de que desde a quinta [1º] a minha demissão já estava decidida.
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E o que me deixa mais triste é a covardia dessa gente. No domingo [4], a Rosário [Ramalho, secretária de Cultura] foi ao concerto no Municipal. A primeira-dama [Ana Estela] foi com a família. Tirou fotografia. Já sabendo que eu estava na rua. No dia seguinte, fui despedido.
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HADDAD
Pediram a minha cabeça mais de uma vez e o prefeito não queria dar. Houve um momento em que a coisa virou [a coluna apurou que Haddad autorizou a demissão ao ser informado de que Neschling queria deixar o teatro, levando os assistentes].
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Telefonei para ele: "Fernando, porra, e nosso trato?". Ele colocou a responsabilidade no IBGC. Mentiu para mim. Minha saída já estava decidida. Essa é minha mágoa. O prefeito, nesse caso, não teve caráter.
Ele está numa campanha complicada e o teatro estava pesando. O MP e a CPI pressionavam pelo meu afastamento. Só que o prefeito não tem nada contra mim.
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TEATRO PODE FECHAR
O Municipal vai fechar. A situação é insustentável. Encontrei o teatro em péssimas condições. A restauração [em 2011] foi uma maquiagem em um cadáver.
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O palco tinha máquinas de 40 anos sem manutenção. A garagem da Praça das Artes tinha 20 centímetros de esgoto e cocô. O teatro não tem seguro contra incêndio.
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O rombo chega a R$ 20 milhões. No fim de 2015, não tinham como pagar salário. O Municipal pode ficar aberto se o prefeito colocar dinheiro. E dinheiro brabo.
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Por que Viena, Lisboa, Istambul, podem ter um teatro e SP não pode? Não estou falando de Londres. Estou falando de cidades normais.
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E, quando se começa a construir um teatro de ópera, vem essa autofagia brasileira. Você não pode botar a cabecinha de fora que vem a mediocridade e corta a tua cabeça. Porque a mediocridade se protege. Ela batalha pela mediocridade. A excelência ilumina a mediocridade. Por isso, quando uma pessoa sai da mediocridade, a mediocridade vai lá e arrasa. Ela não quer ser iluminada.

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