O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reconheceu nesta quarta-feira (6) Jerusalém como capital de Israel, uma decisão histórica que contraria décadas de diplomacia americana e ameaça desencadear uma escalada de violência no Oriente Médio.
"É hora de reconhecer oficialmente Jerusalém como a capital de Israel", declarou o líder americano da Casa Branca, considerando este passo como "condição necessária para conseguir a paz" e pedindo que "a calma e a tolerância" prevaleçam sobre o ódio.
A declaração, que recebeu uma forte condenação regional, encerra sete décadas de ambiguidade diplomática sobre o status de uma cidade que abriga lugares sagrados das três grandes religiões monoteístas, e é igualmente reivindicada por israelenses e palestinos.
Embora o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, tenha dito que a decisão de Trump foi "corajosa e justa", ela suscita profundas dúvidas sobre o futuro do processo de paz.
Para o presidente palestino, Mahmud Abbas, os Estados Unidos perderam seu papel histórico de mediador da paz entre palestinos e israelenses. O Hamas, movimento islamita palestino que controla a Faixa de Gaza, disse que a decisão de Trump "abriu as portas do inferno".
A preocupação da comunidade internacional levou o Conselho de Segurança da ONU a convocar para a sexta-feira uma reunião de emergência para abordar o tema, a pedido de oito países-membros.
Trump também anunciou o início do processo de traslado da embaixada dos Estados Unidos em Israel de Tel Aviv para Jerusalém.
O presidente americano honra uma de suas promessas de campanha, muito elogiada por cristãos evangélicos e por judeus de direita, assim como por muitos de seus doadores.
Seus antecessores, de Bill Clinton a George Bush, fizeram promessas eleitorais semelhantes, mas não as cumpriram depois de assumirem o cargo. "Muitos presidentes disseram que fariam algo e não fizeram nada", disse Trump pouco antes de seu discurso.
- 'Dias de fúria' -
A declaração de Trump deixou muitos aliados americanos e lideranças do Oriente Médio irritados e em busca de uma resposta ponderada, esperando que a região, que se tornou há muito tempo um barril de pólvora, não vire o epicentro de um novo derramamento de sangue.
Em uma frenética rodada de diplomacia telefônica, líderes da Arábia Saudita, do Egito, da Jordânia, da União Europeia, da França, da Alemanha e da Turquia haviam advertido Trump contra a medida.
A Arábia Saudita, principal aliado de Washington na região, condenou a decisão de Trump, tachando-a de "irresponsável", em um comunicado do Palácio Real, citado por veículos oficiais.
Mais cedo, a Turquia condenou a medida nos mesmos termos, enquanto a Jordânia disse que era "uma violação do direito internacional".
"Não pude calar minha profunda preocupação", reagiu o papa Francisco.
Na Europa, a Grã-Bretanha qualificou a medida como de "pouca ajuda", a França a avaliou como "lamentável" e a Alemanha declarou que "não apoia" a decisão.
O traslado da embaixada dos Estados Unidos provavelmente demorará anos para ser implementado, mas as repercussões da decisão de Trump chegaram a preceder o anúncio.
Centenas de palestinos queimaram bandeiras americanas e israelenses e fotos de Trump na Faixa de Gaza, enquanto houve confrontos relativamente pequenos perto da cidade de Hebron na Cisjordânia.
Os palestinos convocaram três dias de protestos, ou "dias de fúria", a partir desta quarta-feira.
Os funcionários do governo americano e suas famílias foram aconselhados a evitar a Cidade Velha de Jerusalém e a Cisjordânia, embora a situação tenha ficado mais calma até o discurso de Trump.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, convocou uma cúpula da Organização de Cooperação Islâmica (OIC), o principal organismo pan-islâmico, em Istambul na semana que vem, para tomar uma ação conjunta.
A Jordânia e os palestinos também pediram uma reunião de emergência da Liga Árabe.
- ONU contra 'medida unilateral' -
A maioria da comunidade internacional não reconhece formalmente Jerusalém como a capital de Israel, insistindo que esse tema apenas pode ser resolvido durante as negociações, um ponto reiterado pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, após a decisão de Trump.
Guterres implicitamente criticou Trump, enfatizando sua oposição a "qualquer medida unilateral que ponha em risco a perspectiva de paz".
Trump insistiu que a medida simplesmente reflete o fato de que Jerusalém Ocidental é continuará sendo parte de Israel sob qualquer acordo. "Isso não é mais, nem menos que um reconhecimento da realidade. Também é o certo", disse.
O presidente americano disse que a decisão ressalta "o firme compromisso de facilitar uma paz duradoura". "Os Estados Unidos apoiariam uma solução de dois Estados caso ambas as partes cheguem a um acordo", afirmou, anunciando também a viagem do vice-presidente Mike Pence à região nos próximos dias.
Em seu discurso, Trump esclareceu que os Estados Unidos não estão se pronunciando sobre qualquer "problema de status final, incluídos os limites específicos da soberania israelense em Jerusalém, ou a resolução das fronteiras impugnadas".
"Essas questões dependem das partes envolvidas", disse.
Israel se apoderou do setor oriental de Jerusalém, em sua maioria árabe, durante a Guerra dos Seis Dias de 1967 e mais tarde o anexou, reivindicando os dois lados da cidade como sua capital.
Os palestinos querem que o setor oriental seja a capital do futuro Estado que aspiram.
Trump alega que decidiu sobre a mudança da embaixada americana em cumprimento de uma lei de 1995, que estabeleceu que a cidade "deveria ser reconhecida como a capital do Estado de Israel" e que a embaixada dos Estados Unidos deveria ser trasladada para lá.
Os sucessivos presidentes americanos adiaram a cada seis meses a mudança por motivos de "segurança nacional", motivo pelo qual a lei até agora ainda não havia entrado em vigor.
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