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segunda-feira, 27 de julho de 2015

Decisão que absolveu PMs diz que ouvir testemunhas era "irrelevante" para caso

Juíza afirmou que prova técnica que sobrepõe à testemunhal
Da Redação (redacao@correio24horas.com.br)
Atualizado em 27/07/2015 17:01:44
  
A decisão da Justiça que absolveu os nove policiais militares envolvidos na morte de 12 pessoas no Cabula, em fevereiro deste ano, foi publicada nesta segunda-feira (27) no Diário Eletrônico de Justiça. Em "julgamento sumário", os nove PMs foram absolvidos, por terem agido em "legítima defesa" durante o curso de uma ação policial normal, diz a decisão.  O Ministério Público já informou que pretende recorrer da decisão.
A juíza substituta Marivalda Almeida Moutinho, da 2ª Vara do Tribunal do Júri, relata a denúncia do Ministério Público da Bahia, que afirmou ter se tratado de uma execução por parte dos PMs, e justificou o julgamento antecipado, citando previsão do artigo 3º do Código de Processo Penal.
"Cabível a antecipação do julgamento, quando estes elementos não se fizeram presentes (indícios de autoria e da prova da materialidade), impossibilitando, até mesmo o oferecimento da denúncia". 
Reconstituição da ação foi realizada pelo DPT no dia 29 de maio
(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)
As testemunhas do caso não foram ouvidas em juízo. Para a juíza, as provas e inquéritos anexados apresentam-se "extremamente convincentes (...) Não soa plausível que a produção de prova testemunhal sobreponha a prova técnica". Ela classifica a "prova técnica" como "superior às demais, especiais". Para a juíza, ouvir testemunhas neste caso se mostra "irrelevante, impertinente e protelatória".
A decisão cita que embora as vítimas não tivessem antecedentes criminais "não estão isentas de terem envolvimentos" com prática de crimes, pois estavam com armas de fogo e drogas, além de explosivos. Cita ainda que as vítimas tinham sinais de disparos de arma de fogo nas mãos. 
"Tratou-se de um confronto armado, em que as vítimas ao portarem arma de fogo e estarem camufladas, preparadas para práticas de ação delitiva, também estariam para o caso de serem surpreendidas na preparação da execução", argumenta. 
Para ela, a versão apresentada pelos PMs foi corroborada pelo inquérito policial, mostrando-se "coerente" com as prova periciais. "Todos os acusados agiram sob o manto da excludente de ilicitude prevista no artigo 25 do Código Penal Brasileiro, em legítima defesa", diz o texto, afirmando que os PMs acusados foram "agredidos moral e fisicamente", vendo-se na necessidade de se defender.
"Atropelo"O promotor Davi Gallo voltou a criticar a decisão judicial e informou que irá recorrer assim que o Ministério Público for intimado. "Esse é um processo que ela fez, ela e polícia. Ela ignorou completamente o Ministério Público. Para ela só vale o que é do inquérito", afirmou.  Ele criticou o uso do julgamento antecipado lide, um procedimento mais rápido. "Não existe isso em um processo penal. Ela fez uma miscelânea de códigos civil e penal. O que essa senhora fez é uma aberração jurídica. Ela sequer ouviu as vítimas que sobreviveram, que inquérito é esse?".
A inclusão do caso do soldado Luciano Santos de Oliveira, que não tem nenhuma ligação com o crime que aconteceu no Cabula, também foi criticada mais uma vez. "Esse caso não tem nada a ver, nada a ver. Nós colocamos como exemplo e ela incluiu e inocentou, de tanta vontade que estava", afirma o promotor. "A legítima defesa no processo, ela tem que estar sem dúvidas. Mas para ela simplesmente valeu ela e o inquérito policial, ignorou completamente o Ministério Público".
No final de semana, o promotor  disse que a decisão “atropela todas as regras processuais”. “Ela cometeu a maior insanidade do mundo, que foi pegar o Código de Processo Civil para julgar. Ela tinha que instruir o Código Penal, mas desprezou o artigo 415 dele”, afirmou, referindo-se ao artigo que dispõe sobre absolvições.
O artigo 415 do Código de Processo Penal prevê absolvição sem os procedimentos usuais apenas nos seguintes casos: quando provada a inexistência do fato; quando provado que o acusado não é autor ou partícipe do crime; quando o fato não constituir crime, ou quando for demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. "No processo penal, não se pode fazer isso (decisão), antes de instruir o processo, das audiências. Tem que ouvir as partes e instruir o processo", afirmou no final de semana Gallo.
Casas vizinhas ao local onde aconteceu a ação foram atingidas pelos disparos
(Foto: Marina Silva/CORREIO)
Decisão criticada e defendida
O diretor executivo da Anistia Internacional, Átila Roque, classificou a decisão como parcial. “Indignação com a recorrente parcialidade da justiça no Brasil, onde as vítimas de homicídios cometidos pela polícia são sempre tratadas antes de qualquer investigação e a absolvição dos policiais é sempre rápida. Cabula é a cara do Brasil”, escreveu, ontem, em uma rede social.
Também pelas redes sociais, o presidente da ONG Reaja ou Será Morto(a), Hamilton Borges, compartilhou a mesma indignação e afirmou que continuará acompanhando o caso. “Não vamos parar. Vamos seguir lutando”, declarou.
Já o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil na Bahia (OAB), Eduardo Rodrigues, disse que vai aguardar a publicação da sentença e espera que o MP recorra da decisão favorável aos PMs, que alegaram legítima defesa. “A OAB aguarda que a sentença seja publicada para termos uma ideia real disso”, resumiu.
Justiça absolveu PMs envolvidos na morte de 12 pessoas no Cabula
(Foto: Evandro Veiga/CORREIO)
Enquanto as entidades repudiavam a sentença, os advogados de defesa que representam os acusados e também advogam em outros processos envolvendo policiais – como o Caso Geovane, denunciado pelo CORREIO – comemoraram a decisão judicial e ainda classificaram os policiais como heróis.
“Desde o início, quando conversamos com nossos clientes, tínhamos certeza da inocência deles. Quem tem que comemorar a decisão da juíza é a sociedade baiana, porque os policiais que estavam lá no Cabula arriscaram suas vidas no exercício da sua profissão”, afirmou o advogado Dinoemerson Nascimento.
Ainda segundo ele, a “decisão mostra que o Judiciário baiano está sensível à atividade do policial militar”. Para o advogado Mateus Medeiros, a sentença não foi rápida, já que o prazo dado pela Justiça para o parecer do caso era de 81 dias e a magistrada levou mais de 60 para concluí-lo. “É uma juíza séria e imparcial. Inclusive, já condenou outros clientes meus”, salientou Medeiros.

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