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sábado, 20 de junho de 2015

Família do RS vai ao STF para ter o direito de educar os filhos em casa

Casal de Gramado fala sobre as vantagens do ensino domiciliar.
Método de ensino não tem amparo legal e é criticado por educadores.

Márcio LuizDo G1 RS
Valentina estuda em casa apoiada pelos pais em Gramado (Foto: Arquivo pessoal)Valentina estuda em casa apoiada pelos
pais em Gramado (Foto: Arquivo pessoal)
Radicada no interior de Gramado, na serra gaúcha, a família Dias aguarda com expectativa uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2013, o comerciante Moisés Pereira Dias, de 37 anos, e a mulher Neridiana, de 36, decidiram tirar a filha mais velha da escola e educá-la em casa, por conta própria. Tiveram de entrar com várias ações na Justiça por conta disso. Agora, os ministros do STF vão decidir se eles – e todos os brasileiros – têm ou não esse direito. Não há data marcada para o julgamento.
A família Dias é adepta do chamado ensino domiciliar, no qual o aluno não frequenta escolas formais e estuda em casa, sob orientação dos pais ou responsáveis. Mais difundida nos Estados Unidos, onde é chamada de “homeschooling”, a prática é adotada por cerca de 2,5 mil famílias atualmente no país, segundo dados da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned). A decisão final do STF pode ser um passo importante para regulamentar de vez o ensino domiciliar. Os ministros vão decidir se a educação caseira pode ou não ser proibida pelo Estado. A decisão vai valer para todos os casos semelhantes.
“Não somos contra a escola. Ela é válida para pais que não tomam para si a responsabilidade de educar os próprios filhos. No nosso caso, temos uma preocupação em formar cidadãos que possam ser úteis para a sociedade, seja um mecânico, seja um médico", diz Moisés.
O comportamento, o rendimento escolar e os valores morais nos levaram a tomar essa decisão"
Moisés Pereira Dias, pai que decidiu tirar os filhos da escola para educá-las em casa
O casal de Gramado tem quatro filhos: Valentina (14 anos), João Pedro (8), Isabela (5) e Ana Clara (3). Apenas a caçula não estuda em casa com os pais porque ainda não tem idade. A filha mais velha foi a única que chegou a frequentar uma escola formal em Canela, o município vizinho. Após concluir o sexto ano do ensino fundamental, ela deixou a escola e nunca mais colocou os pés em uma sala de aula.
“Vários itens estavam nos desagradando. A escola em que ela estudava tinha educação seriada, com alunos de idades e séries diferentes na mesma sala, com o mesmo professor. Não estávamos contentes com isso. O comportamento, o rendimento escolar e os valores morais também nos levaram a tomar essa decisão”, explica o pai.
A família, então, pediu à Secretaria Municipal de Educação autorização para que a filha terminasse o ensino fundamental em casa e prestasse apenas as provas na escola, mas o pedido foi negado sob o argumento de que não tinha amparo legal. O advogado da família, Júlio Cesar Tricot Santos, diz que entrou com um mandado de segurança na Justiça de Canela, que foi julgado em menos de 48 horas e negado. O Tribunal de Justiça (TJ-RS) manteve a sentença, e o advogado levou o caso para Brasília.
Educação 'o tempo inteiro'
Enquanto a questão era discutida nos tribunais, Moisés e Neridiana começaram a educar os filhos em casa. O comerciante diz que a tarefa exige planejamento, preparo e principalmente tempo disponível. “Ensinar os filhos em casa significa abrir mão de muitas coisas. Não é simplesmente pegar a criança e colocar ela sentada em um cadeira e esperar que ela vá aprender sozinha”, comenta.
Toda a semana, um professor contratado pelo casal passa na casa da família e deixa o currículo e as atividades que serão desenvolvidas. Moisés e Neridiana se dividem na tarefa de ensinar os filhos: ela orienta Valentina, enquanto o marido se dedica a João Pedro e Isabela. As aulas duram de duas a três horas por dia, sempre no turno da manhã.
O tempo que sobra é dividido entre atividades extras e o lazer da família. Valentina, por exemplo, faz aulas de piano e gosta também de artes e culinária. Um dos argumentos de pais que defendem o ensino domiciliar é que ele ajuda as crianças e adolescentes a conhecerem e desenvolverem melhor seus talentos. 
“Na parte didática, nós trabalhamos com o princípio de que uma criança é diferente da outra e procuramos incentivar aptidões. Um dos nossos dos filhos gosta mais de história, de geografia, outro de matemática. Esse é o grande diferencial do ensino domiciliar. Em uma escola com 20, 30 alunos, os professores não têm essa intimidade para saber os interesses de cada criança”, destaca Moisés.
Antes de dar aulas aos filhos, o casal não tinha nenhuma experiência prática na área. No passado, Neridiana teve algumas aulas de pedagogia e Moisés, de teologia. As dúvidas, anseios e experiências deles são compartilhadas com outros pais que adotaram o ensino doméstico no estado. Apesar de não haver uma associação formal, eles se reúnem com frequência no município de Taquara. Por enquanto, eles não pensam em voltar atrás.
“Estamos muitos satisfeitos com os resultados. Existem muitos desafios, mas estamos vendo o resultado positivo. A gente aproveita todo o tempo para educar. Eu recomendaria para pais que estão interessados na educação que se seus filhos vão receber, mas cada caso é um caso. Não funciona para todo mundo”, diz Moisés.

Sem amparo legal
Métodos alternativos de ensino como o doméstico ainda não têm amparo legal no Brasil. Os que optam por eles vivem em uma espécie de limbo jurídico, à margem da lei. Por esse motivo, muitos pais que ensinam os filhos em casa evitam a exposição, já que existe a possibilidade de serem denunciados ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público. 
Segundo advogados, algumas interpretações jurídicas possíveis para fundamentar ações contra essas famílias estão baseadas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Ambas as leis determinam que os pais matriculem os filhos na rede regular de ensino. Além disso, o Código Penal caracteriza como crime de abandono intelectual, sujeito a penas que vão de multa até detenção de 15 dias a um mês, deixar de prover a instrução primária de filho em idade escolar.
Eu diria que a gente pode formar pessoas mais intolerantes, que aceitam menos as diferenças"
Sérgio Roberto Kieling Franco, professor da UFRGS e doutor em educação
A decisão do STF, tomada na última sexta-feira (12), pode ser um passo importante para regulamentar de vez o ensino domiciliar. Ao reconhecer a repercussão geral do recurso da família de Gramado, os ministros vão decidir se a educação caseira pode ser proibida pelo Estado ou considerada legal. A decisão vai valer para todos os casos semelhantes. 

Atualmente tramita no Congresso o projeto de lei 3179/12 para legalizar o "homeschooling" no país. Os defensores do ensino doméstico argumentam que o direito dos pais de educar os próprios filhos está previsto na própria Constituição. “A Constituição diz que a educação e direito da criança e dever do Estado e da família. Ou seja, os pais que adotam o ensino domiciliar não estão se isentando de cumprir com esse dever”, diz o advogado Júlio Cesar Tricot.
Educadores não recomendam prática
Se por um lado só se ouve elogios ao ensino doméstico por parte dos pais que aderiram a ele, a mesma visão não é compartilhada por educadores. Para o doutor em Educação e Pró-Reitor de Graduação da Universidade Federal de Rio Grande do Sul (UFRGS), Sérgio Roberto Kieling Franco, a prática parte de um pressuposto simplista do significado de educar. 
“Se a educação fosse só ensino de conteúdos, haveria a possibilidade de a família se ocupar disso. Mas a educação não é só isso. A ideia da educação, como diz o texto da Constituição, tem a colaboração da sociedade. Uma criança vai para a escola para ter contato com outras crianças, ter socialização e aprender conteúdos”, opina.
Na avaliação dos educadores contrários ao ensino doméstico, os pais têm o direito de criticar o modelo atual de escola e de propor melhorias, mas se equivocam ao tentar proteger os filhos de exposição a situações como bullying, competição e a valores diferentes dos adotados pela família. “Eu diria que a gente pode formar pessoas mais intolerantes, que aceitam menos as diferenças. Isso para o estado democrático é muito ruim. A cidadania passa pelo convívio com outras pessoas”, diz o professor.
Já os pais refutam o argumento de que seus filhos são criados em uma espécie de “bolha”. “A sociabilização das crianças começa com os pais. São eles que ensinam os primeiros passos, ensinam a falar. Depois tem os irmãos, os primos, os amigos, a igreja, os clubes, o meio em que a criança convive. Se a gente for parar para pensar, a escola existe há pouco tempo, é uma instituição moderna. Então as crianças que nasceram antes da escola não tinha sociabilização?”, questiona Moisés.
Saiba mais
O que é educação domiciliar
A educação domiciliar ou “homeschooling", no termo em inglês, é um método de ensino no qual o aluno não frequenta escolas formais. As aulas ocorrem na casa do estudante, sob orientação dos pais, responsáveis ou de professores particulares, em casos mais raros. O modelo segue um currículo semelhante ao das escolas regulares. A forma mais comum para que um aluno receba certificação após a conclusão do ensino médio é o Enem.      
O que diz a Lei de Diretrizes e Bases (LDB)
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que regulamenta o sistema educacional brasileiro, é "dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino fundamental".
O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
O artigo 55 do ECA estabelece que “os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”. O Artigo 246 do Código Penal, por sua vez,  prevê que quem deixa de prover instrução primária de filho em idade escolar pode ser indiciado por “abandono intelectual”, cuja pena é detenção de 15 dias a um mês ou multa.
O que diz a Constituição
A Constituição brasileira diz que a educação é um “direito de todos” e “dever do Estado e da família”. Os adeptos da educação domiciliar destacam o termo “família” e argumentam que, se é um dever dos pais dar educação aos filhos, eles têm o direito de escolher como farão isso, delegando a tarefa para uma escola ou se encarregando dela.

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