"Quem prega volta à ditadura não tem visão do que a sociedade precisa", diz Apeles Pacheco
Com orgulho, Apeles Pacheco exibe seu exemplar do discurso da promulgação Constituição Federal de 1988. No livro, uma dedicatória: “Ao amigo Apeles, o primeiro a conhecer este texto, com os agradecimentos de Ulysses Guimarães”. Funcionário da Câmara dos Deputados até hoje, o então assessor do presidente da Assembleia Nacional Constituinte ainda não tinha a dimensão exata do peso político que aquele momento teria nos anos seguintes. Para ele, era apenas mais um manuscrito a ser datilografado e, em seguida, lido por Ulysses Guimarães.
Acompanhe a entrevista:
“Ele queria mesmo que o Brasil fosse democrático. Agora, não tem como voltar, estamos num caminho sem volta. Não se inventou um regime melhor do que a democracia. Daqui pra frente é participação popular. Quem prega a volta à ditadura não tem visão do que a sociedade precisa. Brasileiro é muito sem memória”, avalia.
Apeles compara ainda as diferentes correlações de força existentes naquela época e nos dias atuais. “Forças das mais variadas influenciaram – ruralistas, evangélicos, empresários – o lobby era muito grande. Todo mundo queria botar um pedaço ali. Hoje, você vê forças que vêm aqui para se manter, mas não é tão intenso. Lá, você só tinha um ano para fazer uma nova carta”, diz o servidor.
Segundo Apeles, Ulysses Guimarães era uma pessoa “ao mesmo tempo simples e grandiosa”. “Ele realmente queria chegar ao poder – todo político quer chegar ao poder –mas ele chegou lá de uma forma natural, de uma forma política e sendo aceito. Lógico, ele não foi aceito pela ditadura, mas acabou sendo aceito depois como um grande líder”, afirma o ex-assessor, em meio a manuscritos, jornais da época, fotografias e outros documentos históricos.
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Entre as recordações, está um dia em que Apeles datilografava um manuscrito na sala do então presidente da Câmara quando, de repente, o deputado surgiu enrolado numa toalha de banho, para fazer alterações no texto. “Para você ver como que ele era, deixava a gente tão à vontade”, brinca o ex-assessor.
Em 1990, na sua última eleição para deputado federal, Ulysses Guimarães foi surpreendido com uma redução de 590 mil votos, em 1986, para 46 mil votos naquele ano. De acordo com Apeles, o baixo desempenho foi motivado pelo tom da campanha, cujo mote adotado foi “bote fé no velhinho”. “Era uma contra-campanha”, afirma.
Naquele ano, o peemedebista perderia o comando do partido para Orestes Quércia e deixaria o posto com um discurso também memorável, conhecido como “Oração do Adeus”. Deste, Apeles ainda guarda os manuscritos. Ele também guarda o jornal “Hoje na Câmara” que circulou pela Casa após o dia 12 de outubro de 1992, quando o parlamentar foi morto por um acidente de helicóptero.
“Ulysses era uma pessoa que realmente mereceu todas as homenagens”, elogia, nostálgico, o datilógrafo do presidente da Assembleia Nacional Constituinte de 1988.
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