Ex-presidente assume interlocução entre centrais e partido e endossa críticas ao PL da terceirização com recados a Dilma
Uma das autocríticas recorrentes que o PT tem feito no momento mais agudo da crise atravessada pelo partido – associado a denúncias de corrupção na Petrobras e em outras áreas do governo – é justamente o afastamento de suas bases sindicais. Diante dessa constatação, a ordem é voltar às origens e buscar uma reaproximação com centrais sindicais alinhadas à sigla. O escolhido para capitanear o trabalho: Lula. "Não há melhor 'soldado' para fazer essa reaproximação", disse uma fonte petista ao iG.
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A ofensiva começará por São Paulo, em especial o ABC paulista, região onde Aécio Neves superou Dilma Rousseff nas eleições presidenciais de 2014, mesmo em cidades administradas pelo PT. Em São Bernardo do Campo, por exemplo, Aécio teve 55% dos votos ante 44% de Dilma. Em São Caetano, a derrota mais acachapante: 78% do tucano contra 22% da petista.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o indutor desse processo e recorrentemente tem participado de eventos da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e de seus sindicatos, especialmente do início do ano para cá.
"Com a ajuda dele o movimento sindical tem mais chance de dialogar com a Dilma, o que não aconteceu no primeiro mandato", destaca um sindicalista.
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Agenda e pautas em comum
Na última terça-feira (28), por exemplo, o ex-presidente voltou no tempo ao participar de um seminário promovido pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo - filiado à CUT - que relembrou os 35 anos da greve de 1980, quando Lula era o presidente da entidade.
Lula engrossou o discurso contra o Projeto de Lei 4330 que regulamenta a terceirização, um dos alvos preferenciais do braço sindical da sigla. "É um retrocesso a antes do governo de Getúlio Vargas. Estamos voltando a 1930, tentando estabelecer uma relação de trabalho com um só ganhador, o patrão. E milhões de perdedores, os trabalhadores. Com essa lei, eles querem voltar ao passado, quando a classe trabalhadora era tratada da forma mais perversa possível", disparou.
O texto foi aprovado em votação tumultuada na Câmara e a partir do dia 12 de maio começa a tramitar no Senado. Sem titubear, o ex-presidente cravou na mesma data que "tranquilamente, a companheira Dilma vai vetar" a matéria.
Lula também manifestou outra preocupação, que tem de estar no radar do PT. “Estou muito preocupado com a formação política dessa molecada”. Ao recomendar que os jovens dirigentes assistam a filmes que contem a históricas greves do ABC no final dos anos 70 e começo dos 80, Lula sentenciou que as jovens lideranças “negam tudo [na mesa de negociação] e não sabem o que os pais deles fizeram”.
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Laços reforçados
A deixa que reforça os laços entre PT e sindicalistas - levando ambos às ruas de algumas capitais do País e em especial à Brasília - é justamente a votação no Congresso Nacional do PL da terceirização.
O combate ao texto de autoria de Sandro Mabel (PR-GO) vai pautar o 1º de maio da CUT, que elegeu o presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como principal algoz. O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC promete, junto com outras entidades, lotar o ato da CUT marcado para a próxima sexta-feira (1º) no Vale do Anhangabaú.
Se Eduardo Cunha tornou-se algoz, o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) emite sinais de que a matéria, aprovada a fórceps na Câmara, terá uma tramitação criteriosa na Casa comandada por ele – promessa que, aliás, afastou os dois peemedebistas.
Calheiros recebeu em Brasília na mesma terça-feira (28) lideranças da CUT, da Central dos Trabalhadores Brasileiros (CTB), Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST) e União Geral dos Trabalhadores (UGT). Presidente da CUT, Vagner Freitas atacou o projeto usando os mesmos argumentos do ex-presidente Lula.
“O que eles [os defensores do projeto] querem é desregulamentar toda a legislação trabalhista brasileira. O Brasil tem alguns valores importantes que a gente foi construindo ao longo da história. Getúlio Vargas deixou um legado, a carteira assinada e a CLT que agora corremos risco de perder”, pontuou Freitas.
O dirigente pediu ainda a construção de um acordo com a base do governo para aprimorar o 4330. Além disso, quer o acesso às galerias do Senado pelos trabalhadores durante a votação – na Câmara, Cunha impediu o acesso à sessão de votação e houve conflitos na parte externa da Casa.
Calheiros enfatizou: "Não tenho compromisso com o cronograma de negociação. Se a terceirização da atividade-fim for aprovada, o país terá um novo modelo de desenvolvimento que não privilegia os direitos dos trabalhadores e, sim, a precarização. O Senado tem a exata noção da responsabilidade quanto ao tema e vai discutir o PL 4330 com debates públicos quantas vezes forem necessárias”, assegurou o presidente do Senado ao final do encontro.
Afinados, mas nem tanto
A CUT é a central sindical que tem uma união mais duradoura e fiel com o PT. Na crise do Mensalão, de 2005, os sindicalistas defenderam que o Supremo Tribunal Federal (STF), na figura do ministro Joaquim Barbosa, promoveu um julgamento político ao condenar dirigentes do partido.
Na campanha de Dilma Rousseff à Presidência em 2014, a mobilização da central foi vital para o corpo a corpo que deu à petista a vitória numa votação apertada contra o tucano Aécio Neves (MG).
Eleita, Dilma recebeu as centrais em reuniões em dezembro de 2014 e em mais dois encontros em fevereiro e março desse ano. Durante todo o primeiro mandato, no entanto, esses encontros eram raros e conduzidos pelo então ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Carvalho deixou o governo no começo de 2015.
No entanto, a entrega do Ministério da Fazenda ao “neoliberal” Joaquim Levy, que trouxe consigo mudanças na concessão do segundo desemprego e a ameaça de recuo em outros direitos trabalhistas fizeram as centrais recorrerem a Lula. O ex-presidente teria dito a interlocutores que Dilma não o ouve mais.
Daí que o ex-presidente não se cansa de mandar recados à sucessora a cada evento com os sindicalistas.
“Dilma, conte conosco para qualquer coisa. Mas, por favor, tente fazer com que o Congresso Nacional respeite as conquistas históricas da classe trabalhadora. É o mínimo que nós queremos que aconteça neste País”, disse na abertura do 9º Congresso Nacional dos Metalúrgicos da Central Única dos Trabalhadores (CUT) realizada em Guarulhos no último dia 14 de abril.
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