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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

EUA esbarram em problemas logísticos em pesquisa da zika na PB

Equipes lideradas por epidemiologista americana estão indo de casa em casa coletar dados e material de mães cujos filhos nasceram com microcefalia.

Júlia CarneiroDa BBC
Maria da Luz Mendes Santos soube aos sete meses de gravidez que a menina que esperava viria com uma condição na qual nunca tinha ouvido falar.
"Disseram que ela estava com microcefalia e eu não sabia o que era. Fiquei muito assustada", lembra ela na maternidade Cândida Vargas, em João Pessoa, na Paraíba. "Agora estou mais tranquila. Ela é sadia e sabida", diz, com a filha no colo.
Órgão médico dos EUA inicia pesquisa do zika na Paraíba esbarrando em problemas logísticos (Foto: BBC)Órgão médico dos EUA inicia pesquisa do zika na Paraíba esbarrando em problemas logísticos (Foto: BBC)
Heloisy tem dois meses e até hoje a mãe não sabe o que causou a microcefalia. A condição a uniu a centenas de outros bebês nascidos com cabeças menores que o perímetro de 32 centímetros estabelecido como parâmetro pelo governo. Maria da Luz não acha que teve zika; só se lembra do que interpretou como uma gripe, por volta dos 5 meses de gravidez.
Agora espera ter uma resposta concreta em breve, fazendo parte de uma pesquisa que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) acaba de começar na Paraíba– o segundo Estado mais afetado pelo surto de microcefalia, com 59 casos confirmados e 440 ainda em investigação.
Especialistas em segurança epidemiológica do CDC começaram a ir a campo nesta semana em João Pessoa, dando início a uma pesquisa em parceria com o Ministério da Saúde para estudar a relação entre o vírus da Zika e microcefalia.
Órgão médico americano e Ministério da Saúde iniciam pesquisa sobre o zika vírus na Paraíba  (Foto: BBC)Órgão médico americano e Ministério da Saúde iniciam pesquisa sobre o zika vírus na Paraíba (Foto: BBC)
Formadas por técnicos do CDC e agentes de saúde do ministério e das secretarias locais, as oito equipes estão indo de casa em casa e a hospitais. O trabalho seguirá por aproximadamente cinco semanas para coletar dados e material de cerca de cem mães que tiveram suspeita de zika e cujos filhos nasceram com microcefalia.
Para cada um desses casos, serão examinadas também duas a três mulheres cujos filhos nasceram saudáveis, os chamados casos de controle, para tentar entender a frequência com que o vírus da Zika gera problemas neurológicos, como atua e se há outros fatores na equação.
Maria da Luz foi uma das primeiras entrevistadas, no segundo dia da pesquisa. Apareceu para o encontro marcado na maternidade com o marido, Juliano Silva, e a filha de 9 anos.
Carregava a recém-nascida Heloisy vestida em um macaquinho branco e rosa e com uma toalhinha sobre o ombro, bordada, também de rosa, com os dizeres "sou do papai" – orelha já furada com um brinquinho dourado, que parecia uma versão menor do brinco usado pela mãe.
Durante cerca de meia hora de entrevista, a agente do Ministério da Saúde fez uma série de perguntas para entender seu histórico de saúde, problemas que pode ter enfrentado na gravidez, se teve qualquer sintoma indicativo do zika vírus ou de outras doenças. Maria da Luz respondia cooperativa e sorridente; interrompeu a entrevista duas vezes para dar de mamar à filha.
Médicos brasileiros apreciam chegada de americanos com recursos  (Foto: BBC)Médicos brasileiros apreciam chegada de americanos com recursos (Foto: BBC)
Como será feito em todos os casos, a criança teve o perímetro cefálico e o corpo medidos, e mãe e filha tiveram sangue coletado – a menina aos urros enquanto a família tentava acalmá-la, com um macio cântico de "ôooooo, ôooooo...".
Parte do material coletado ficará no Brasil e outra parte será levado aos EUA para exames minuciosos no CDC – que indicarão se Maria da Luz teve, afinal, zika durante a gravidez e se o vírus foi transmitido para a sua filha. Diagnóstico ao qual Maria da Luz não teria acesso no Brasil.
"Realmente é importante fazer esse estudo para saber o que está provocando a microcefalia", diz o Juliano Silva, seu marido. "Quando a gente soube foi bem preocupante, a gente ficou triste, ela entrou numa depressão, chorava pelos cantos. Graças a Deus, nossa filha nasceu bem, e é uma criança muito amada."
A pesquisa ainda está no começo e, nos primeiros dias, esbarrou em problemas logísticos, com equipes passando mais tempo no carro tentando chegar aos endereços ou dando de cara com a porta para entrevistas que deveriam estar agendadas mas não estavam.
O trabalho de campo deve durar cerca de cinco semanas e em breve passará para cidades no interior do estado. Erin Staples, a epidemiologista que lidera o estudo, diz que os resultados devem ser divulgados perto do fim deste semestre.
"Estamos buscando responder algumas perguntas básicas e entender quantos desses casos de microcefalia poderiam ser relacionados ao vírus da Zika, quantas crianças pegaram o vírus na barriga da mãe e se é só o vírus ou se há outros fatores envolvidos", explica ela.
"O tamanho e o escopo do que está acontecendo vai muito além de qualquer coisa que eu já tenha visto na minha carreira."
Os casos de "controle", examinando crianças saudáveis nascidas nas mesmas regiões que os bebês com microcefalia, são importantes para entender se eles também têm sinais do Zika. Se muitas tiverem, explica Staples, isso poderia reforçar a ideia de que outros fatores estariam relacionados à condição.
No Instituto Cândida Vargas, maternidade municipal com o maior número de leitos em João Pessoa, mais de 53 bebês já nasceram com microcefalia, e outros 96 são casos suspeitos, que ainda estão sendo investigados.
Coordenadora da unidade neonatal da Cândida Vargas, Juliana Soares diz que é um momento de muito aprendizado mas também de angústia para profissionais da área médica.
"O problema precisa ser captado e cortado na origem, mas isso a gente ainda não visualiza. Não tem nada que pare esse vírus hoje", diz.
"Por isso a angústia de todos os profissionais que trabalham neste ambiente. Não tem vacina, tratamento para a mãe, alguma medicação que bloqueie essa contaminação do bebê. Se a mãe for contaminada, a gente vai continuar com essa perspectiva de sequela no desenvolvimento do bebê."
Neste contexto, ela dá boas vindas aos pesquisadores estrangeiros, munidos de recursos em um patamar muito distante do brasileiro, ainda mais com a economia em recessão.
"Tínhamos que ter pedido ajuda mesmo. Quem puder dar essa resposta primeiro estará fazendo algo útil para o mundo. Isso não está mais só no Brasil. Temos que nos juntar, com responsabilidade e seriedade para conseguir chegar a uma resposta."
Maria da Luz hoje já tem muitas informações sobre a microcefalia, mas a pergunta sobre o que causou a condição na sua filha ainda é um vazio no ar. Ela só torce para que isso pare o mais rápido possível, antes de prejudicar outras crianças. Quanto à sua, não perde a esperança de ver Heloisy se desenvolver bem.
"Eu quero que ela cresça e se desenvolva como uma criança normal. Que possa andar, correr, brincar, estudar. Esse é meu maior sonho. Vê-la andar, falar."
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